Foram 65 votos favoráveis e 11 contrários; atualmente subprocurador-geral, ele ocupará o posto vago desde o fim do mandato de Augusto Aras
Após sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (13) a indicação de Paulo Gonet para comandar a Procuradoria-Geral da República (PGR). Foram 65 votos favoráveis, 11 contrários e uma abstenção.
Gonet, atualmente subprocurador-geral, ocupará o posto vago desde o fim do mandato de Augusto Aras.
Conforme se esperava, Gonet obteve uma margem maior, tanto na votação da CCJ quanto no plenário, do que o indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, que enfrentava forte resistência na oposição e foi sabatinado na mesma sessão.
A sessão na CCJ começou sob protestos da oposição contra o formato de sabatinas simultâneas e pedido para que os indicados fossem questionados separadamente, mas o presidente da comissão, Davi Alcolumbre (União-AP), não recuou, alegando que estavam “todos avisados, há alguns dias da decisão”. Cada senador teve 10 minutos para fazer perguntas aos dois.
Em sua apresentação, Dino, antecipando-se à artilharia dos adversários, afirmou que não estava ali para fazer “debate político”. Em diversos momentos durante os questionamentos, ele foi cobrado quanto a declarações e posicionamentos de cunho político e acusado de não possuir isenção para atuar no STF. Dino, que adotou a estratégia de evitar embates com os oposicionistas, alegou que sabe distinguir o papel de juiz do de político e que não se pode deduzir “o que um juiz será a partir da leitura da sua atitude como político”.
No caso de Gonet, embora a inquirição tenha transcorrido sem sobressaltos, ele foi questionado sobre assuntos espinhosos, como suas posições sobre pautas de costumes, como cotas raciais e casamento homoafetivo, e seu parecer favorável à inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (veja abaixo).
Questionados sobre o posicionamento a respeito do inquérito das fake news, em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF), tanto Gonet quanto Dino evitaram comentar. Gonet disse que parte da investigação está em segredo de Justiça e que não tem informações para fazer uma abordagem objetiva sobre o assunto. O indicado à PGR ressaltou ainda que não cabe a ele conhecer o inquérito antes de ser aprovado para o cargo.
Quando questionado sobre o fato de parte das imagens captadas pelas câmeras de segurança do Ministério da Justiça no dia 8 de janeiro não terem sido entregues à CPI do Congresso Nacional, Dino alegou que todas as gravações externas foram enviadas à CPI e ressaltou que o ministério não foi invadido. O ministro também disse que as câmeras internas funcionam com sensor de movimento e não registraram nada, pois o prédio estava vazio. Ainda segundo Dino, as imagens são automaticamente apagadas depois de 30 dias.
Em resposta a Esperidião Amin (PP-SC), que afirmou que houve “inação da Força Nacional” no dia 8 de janeiro, Dino negou ter recebido avisos da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) três dias antes da invasão e negou omissão.
— Não cometi nenhuma ilegalidade. Por cautela, coloquei a Força Nacional à disposição, mas a Esplanada dos Ministérios é policiada pela Polícia Militar do Distrito Federal e nenhuma força do Ministério da Justiça estava com esse dever legal — respondeu.
O líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), também abordou a visita de Dino ao Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, em março, “com pouquíssima condição de segurança pública”, enquanto dizia que “temia pela sua integridade física” em audiências a que foi convocado, na Câmara. Em resposta, Dino apresentou ofícios para todos os órgãos de segurança pública responsáveis, solicitando proteção na visita à Maré.
Durante a sabatina, parlamentares de oposição apontaram diversas declarações feitas por Dino, alegando que ele não teria a isenção necessária para julgar, no STF, adversários políticos.
— Vossa excelência fez afirmações como “Bolsonaro é um serial killer. É o próprio demônio”. Vossa excelência acredita que caso seja ministro do STF terá isenção para julgar Bolsonaro ou aqueles com afinidade com o bolsonarismo? — disse Rogério Marinho (PL-RN).
Após reiteradas perguntas sobre o tema, Dino alegou que eventuais casos envolvendo adversários terão “o tratamento que a lei prevê”.
Questionado sobre política de cotas, Gonet respondeu que cotas são instrumentos legítimos, porém “drásticos”, e devem ser reservados para casos de discriminação histórica, com prazo de vigência.
Também questionado sobre casamento homoafetivo, adoção por casais homoafetivos e homofobia, Gonet alegou que, como jurista, respeita as decisões do Parlamento e do STF sobre os temas. Alegou, porém, que a criminalização da homofobia precisa ser decidida expressamente pelo Congresso, em vez de se buscar equiparação com outros crimes, como o racismo. Também declarou que seria “tremendamente injusto” que duas pessoas que vivem juntas como unidade familiar não tenham nenhum reconhecimento ou proteção por parte do Estado.
O senador Efraim Filho (União-PB) questionou os indicados sobre a descriminalização das drogas para consumo próprio. Paulo Gonet afirmou que o tema divide a sociedade, com argumentos de todas as perspectivas. O indicado à PGR ressaltou que o assunto deve ser decidido pelo Poder Legislativo. Ele afirmou que o STF está fazendo, atualmente, uma interpretação da legislação em vigor sobre o uso de drogas. Segundo Gonet, ainda vai haver um diálogo institucional muito interessante sobre o tema.
Em questionamento a Dino, o senador citou ainda os julgamentos de ações sobre liberação do aborto, afirmando que o tema, assim como as drogas, não pertence ao fórum jurídico. Em resposta, Dino se disse contrário a que o Poder Judiciário faça essas mudanças unilateralmente e afirmou que cabe ao Congresso Nacional rever as leis. Em relação às drogas, o indicado disse concordar que existem questões a serem debatidas, papel do Parlamento brasileiro. Ele ainda frisou que não se pode esquecer do alcoolismo, “a maior drogadição abusiva que existe na sociedade”, e classificou o problema como “dramático, que devasta milhões de vidas”.
O senador Magno Malta (PL-ES) questionou o voto de Paulo Gonet, como vice-procurador-geral eleitoral, a favor da inelegibilidade do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, por oito anos. Em resposta, o indicado à PGR afirmou que o parecer proferido foi resultado de um estudo apurado dos fatos relatados nos autos. Segundo Gonet, o caso estava enquadrado na hipótese prevista em lei, levando à consequente inelegibilidade.
Diante de questionamento do senador Dr. Hiran (PP-RR) sobre posição do STF de derrubar a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, que o parlamentar considera fator de geração de insegurança jurídica, Flávio Dino lembrou que o Congresso pode derrubar o veto a uma lei sobre o tema. O indicado ao STF afirmou que não se manifestaria sobre a questão para não ficar impedido de votar em eventual julgamento. Ainda assim, Dino afirmou que defende a construção de caminhos que tragam segurança jurídica e paz, e que a Amazônia seja uma referência em sustentabilidade ambiental e social.
Sobre o mesmo tema, Paulo Gonet apontou que espera “um verdadeiro diálogo institucional” entre o Judiciário e o Legislativo, e que “ a melhor solução haverá de prevalecer”.
Para Flávio Dino, é necessário o aprimoramento do diálogo federativo de modo a achar soluções duradouras para o problema:
— Procedem-se a desintrusões custosas, difíceis, com custos materiais e humanos, e daqui a um ano a situação fática é rigorosamente igual.
Paulo Gonet opinou que a União não pode suprimir a autonomia do Estado na criação de unidades de conservação e apelou ao equilíbrio entre esferas:
— Creio que esse equilíbrio deve ser buscado, em primeiro lugar, pela ação concertada dos órgãos políticos, mas o Ministério Público Federal acompanhará esse processo atentamente.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) pediu a opinião do indicado ao STF sobre controle da mídia, uso político da Polícia Federal e a futura relação dele, como possível ministro do STF, com os parlamentares. Em resposta, Dino disse que os inquéritos que enviou à PF foram embasados em fatos. Ele também reafirmou que, como ministro do Supremo, não terá atuação política. Em relação ao controle de mídia, Dino disse que é importante “todos medirem as palavras”, para que a liberdade não justifique a prática de um algum crime. Ele disse que a regulação é importante para a prevenção de atos criminosos.