Seis anos e meio depois, caso de contadora assassinada no noroeste do RS ainda aguarda recursos - Agora Já -

Seis anos e meio depois, caso de contadora assassinada no noroeste do RS ainda aguarda recursos



Em janeiro de 2018, Sandra Mara Lovis Trentin desapareceu de Boa Vista das Missões. O marido dela, o então vereador Paulo Ivan Baptista Landfeldt, é acusado de ter mandado matar a mulher. Ele e o outro réu, Ismael Bonetto, apontado como executor, estão presos

Foto: Sandra vivia com o marido e três filhas em Boa Vista das Missões. Arquivo Pessoal / Facebook
5 de agosto de 2024

Seis anos e meio se passaram desde o dia em que Sandra Mara Lovis Trentin, 48 anos, deixou a casa onde vivia com a família em Boa Vista das Missões, no noroeste do Rio Grande do Sul, para ir até o município vizinho, Palmeira das Missões, e nunca mais foi encontrada com vida.

Cerca de um ano depois, no início de 2019, o corpo da contadora foi localizado às margens da BR-158, num matagal. A investigação levou à prisão do marido, o então vereador Paulo Ivan Baptista Landfeldt, 53, e de Ismael Bonetto, 27, apontado como o executor do assassinato.

O processo segue em andamento na Justiça, mas ainda não há previsão de realização do júri. Tanto Landfeldt como Bonetto, que negam terem cometido o crime, permanecem presos — o ex-vereador chegou a deixar a cadeia em 2018, mas retornou em maio do ano seguinte, após a localização dos restos mortais da esposa.

O caso está no Superior Tribunal de Justiça (STJ), para julgamento de um recurso especial contra a sentença de pronúncia. Em 2021, a juíza Vanessa Silva de Oliveira determinou que os réus devem ser submetidos ao Tribunal do Júri pelos crimes de homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Depois disso, a defesa de Landfeldt recorreu contra essa decisão.

Ainda tramita o pedido da defesa de Landfeldt, que tenta evitar que ele vá a júri. Até o momento, não há previsão de quando deve ser julgado esse pedido pelo STJ. Somente após essa etapa, é que o processo deverá retornar para Palmeira das Missões.

Caso sejam mantidas as decisões iniciais, a Justiça então agendará a data do julgamento dos dois. Como se trata de crime contra a vida, neste caso, homicídio, sete jurados da comunidade são sorteados para definir se os réus são culpados ou inocentes das acusações. Mas ainda não há previsão de quando isso deve ocorrer.

Filhos

Rômulo Trentin, 33 anos, é o primogênito de Sandra Mara – ela também era mãe de três filhas, duas adolescentes e uma jovem, fruto do relacionamento com Landfeldt. A vida dos quatro se alterou completamente após a perda, segundo o filho. O engenheiro eletricista deixou Palmeira das Missões, onde vivia, e decidiu morar em Passo Fundo. As irmãs também se mudaram de Boa Vista das Missões e passaram a residir com familiares.

— A nossa maior dor dentro de todo esse período é o fato de não ter nossa mãe presente — diz.

Os filhos de Sandra acompanham o andamento do processo, na expectativa de que o caso tenha algum desfecho na Justiça em breve.

— Temos ciência de que os últimos acontecimentos do nosso Estado (a enchente de maio) podem atrasar o júri. A gente acredita e confia que vamos conseguir esclarecer, saber o que realmente aconteceu. E vamos ter justiça em relação aos envolvidos — afirma Rômulo.

Ana Paula Trentin, atualmente com 18 anos, chegou a morar com a avó materna, mas atualmente reside em Santa Maria, na Região Central. A jovem diz que não saber o que realmente aconteceu com a mãe lhe angustia.

— Ficar sem uma mãe não é fácil para ninguém, ainda mais sem saber ao certo o motivo para que tenham feito ela nos deixar. Já faz mais de seis anos que não temos nenhuma resposta sobre o que aconteceu. Isso nos corrói mais a cada ano que se passa. Cada dia 30 de janeiro que vivemos é uma dor em nosso coração. Percebemos há quanto tempo estamos sem ela e sem uma resposta. A saudade aumenta cada vez mais — desabafa.

Reviravoltas

O desaparecimento de Sandra e, posteriormente, a descoberta de seu assassinato gerou série de reviravoltas ao longo dos últimos anos. O marido foi apontado pela Polícia Civil como mandante do crime, enquanto Bonetto é acusado de ter sido o autor do homicídio.

Landfeldt foi preso antes mesmo de o corpo da esposa ser encontrado. Foi detido após a Bonetto ser preso em Lages, Santa Catarina, e confessar à polícia ter matado a contadora a mando do então político.

Na época, segundo a polícia, Bonetto admitiu ter sido pago para interceptar a vítima e executá-la. Para o Ministério Público, o então vereador prometeu ao executor o pagamento de R$ 40 mil para assassinar Sandra Mara a tiros e esconder o corpo.

Inicialmente, Bonetto confessou ter assassinado a contadora com um tiro no peito e enterrado o corpo em Vicente Dutra (a 65 quilômetros de Boa Vista das Missões). Uma semana depois, voltou atrás e disse que havia mentido.

O ex-vereador alega que foi procurado por Bonetto, que afirmava pertencer a uma facção e saber o paradeiro de Sandra. Para isso, teria exigido pagamento em dinheiro. O marido chegou a registrar essa suposta extorsão numa ocorrência na polícia e, logo depois, Bonetto acabou preso.

Quando ele apresentou a versão sobre quem seria o mandante, Landfeldt também teve a prisão preventiva decretada. No entendimento da acusação, o crime teria sido cometido para que o marido pudesse ficar com os bens da família e assumisse outra relação, sem que houvesse separação, já que o casal viveria um relacionamento conturbado.

O caso

Desaparecimento

Reprodução / Reprodução
Câmera registrou trajeto feito a pé por Sandra na manhã de 30 de janeiro para ir buscar carro. Reprodução / Reprodução

Sandra Mara saiu da casa onde residia com o marido e três filhas, de 16, 11 e cinco anos na época, em Boa Vista das Missões, na manhã de 30 de janeiro de 2018. A contadora pegou a caminhonete que estava na residência do cunhado, passou no escritório de contabilidade, na mesma rua, e por volta das 7h30min seguiu para Palmeira das Missões.

Sandra Mara chegou a passar na Junta Comercial, no centro da cidade vizinha. Depois disso, circulou pelas ruas da área central da cidade e estacionou na Rua Rio Branco, ao lado de um CTG. A partir dali, não foi mais vista.

Carro encontrado

O carro da vítima, uma Ranger, foi encontrado em Palmeira das Missões. Dentro do veículo, foram achados dois chips e o cartão de memória do celular, a bolsa dela, um par de sapatilhas, dinheiro e diversos papéis do escritório. A família percebeu o sumiço do celular e da carteira de habilitação.

Extorsão e prisões

Galileu Guerra / Especial
Paulo Ivan Baptista Landfeldt, 53, marido de Sandra, é acusado de ser mandante do crime. Galileu Guerra / Especial

Em fevereiro, o marido de Sandra procurou a polícia para afirmar que estava sendo extorquido por um rapaz, que afirmava estar com a contadora. Dois dias depois, este mesmo jovem, identificado como Ismael Bonetto, então com 22 anos, foi preso em Lages, Santa Catarina. A prisão mudou os rumos da investigação. Bonetto confessou à polícia que tinha sequestrado e assassinado com dois tiros a contadora, a mando do marido dela. No mesmo dia, Landfeldt foi preso.

Novo depoimento

Uma semana após a prisão, Bonetto voltou atrás e disse que mentiu sobre ter assassinado a contadora a mando do vereador. Contou que ficou sabendo do desaparecimento por uma vizinha e que decidiu extorquir Landfeldt, mentindo que estava com Sandra. Mas não soube explicar por que disse à polícia que havia matado a mulher.

A Polícia Civil entendeu, no entanto, que a primeira versão apresentada pelo jovem preso era a mais próxima do que aconteceu com a contadora e indiciou os dois. Até então, Sandra Mara seguia desaparecida.

Corpo encontrado

Quase um ano após o sumiço de Sandra Mara, em janeiro de 2019, uma ossada foi encontrada enterrada no limite de Palmeira das Missões e Condor — a cerca de 40 quilômetros de onde a contadora sumiu. O cadáver foi encontrado em um matagal próximo de uma lavoura de soja. Na mesma cova rasa, estavam pertences da contadora, como cartões bancários. A análise da arcada dentária confirmou que os restos mortais eram da vítima.

A causa da morte não pode ser apontada com precisão, em razão do tempo transcorrido entre o óbito e a localização da ossada. Segundo o Ministério Público, a possibilidade de morte por disparo de arma de fogo não foi descartada pelos peritos. No entanto, na cova e nos restos mortais não foi encontrado nenhum projétil.

Preso nega

Em entrevista a Zero Hora, no Presídio Estadual de Palmeira das Missões, Ismael Bonetto negou o crime e alegou que extorquiu o político ao saber do desaparecimento de Sandra, mas que nunca teve envolvimento no sumiço dela.

— Tentei me aproveitar da situação, quando deu tudo aquilo lá para extorquir, tirar dinheiro dele, dizer que sabia o que tinha acontecido. Tudo que falei é uma bobagem — disse.

Contrapontos

O que diz a defesa de Ismael Bonetto

Os advogados Volnete Gilioli  e Lucas Estevan Duarte enviaram nota, na qual afirmam que estão buscando na Justiça que o réu possa ser julgado. A defesa moveu recurso, na tentativa de que o processo seja dividido, para que o cliente possa ir a julgamento.

Confira a nota na íntegra:

“Ismael Bonetto, por intermédio de sua defesa, vem manifestar que está preso por mais de 06 anos e tem buscado a realização o quanto antes de seu julgamento perante o Tribunal do Júri. 

Atualmente o processo se encontra aguardando julgamento de recurso interposto pelo corréu Paulo nos tribunais superiores.

Ismael não recorreu por entender que somente o conselho de sentença é responsável por analisar os fatos denunciados e proferir uma decisão justa. 

Houve pedido de cisão do processo para que Ismael não precise aguardar a decisão dos Tribunais Superiores para ser marcada sessão do tribunal do júri, tendo sido negado pelo juiz de Palmeira das Missões, havendo recurso e estando pendente de julgamento pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul”.

O que diz a defesa de Paulo Ivan Baptista Landfeldt

O advogado João Taborda, um dos responsáveis pela defesa do réu, afirma que não existem provas que liguem Landfeldt à morte da esposa. Os advogados vêm tentando evitar que o ex-político vá a júri pelo crime.

— Estamos buscando nas instâncias superiores ser revista a pronúncia do meu cliente Paulo — disse.

Fonte : GZH 
Foto : Arquivo Pessoal / Facebook 

 


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