Maioria das vítimas tem mais de 60 anos e possui comorbidades
O Rio Grande do Sul tinha até o início da tarde desta quarta-feira (27) 34.434 casos confirmados de dengue e 45 mortes pela doença. De acordo com o painel da Secretaria Estadual da Saúde (SES), outros 16 mil casos suspeitos são investigados. Números que olhados de forma mais atenta mostram outra preocupação: a alta letalidade. Segundo o Ministério da Saúde, 12% dos casos graves terminam em morte no Estado, o maior índice do Brasil. Sergipe (10,53%), Paraíba (9,09%), Tocantins (8,33%) e Amapá (8%) completam o top cinco.
A taxa de letalidade é um indicador que apresenta a mortalidade entre quem adoeceu pela dengue, diferentemente da taxa de mortalidade, que é obtida dividindo-se o número de óbitos pela população.
Um dos fatores que pode explicar o índice elevado de letalidade em solo gaúcho é a faixa etária – considerando que a população gaúcha é a “mais velha do Brasil”. Das 45 mortes pela doença, 31 foram de pessoas acima dos 60 anos.
— Nós temos muitos casos acontecendo envolvendo pessoas de mais idade, que já têm, também, comorbidades associadas. Não é esse mesmo perfil de adoecimento que acontece nos outros Estados brasileiros — explica a diretora do Cevs/RS, Tani Ranieri.
Diferentemente de outras regiões do país, que já vivem grandes epidemias há mais tempo, a gestora acredita que muitos profissionais gaúchos ainda não estejam habituados a manejar casos de dengue.
Tani acrescenta, ainda, que a gravidade dos casos também pode estar relacionada ao comportamento das pessoas infectadas pelo vírus, que acabam subestimando os primeiros sintomas, a manifestação clínica do quadro:
— Acabam procurando, muitas vezes, de forma mais tardia. E quando o fazem já estão com sinais de alerta. Por se tratarem de pessoas com uma condição de saúde um pouco mais fragilizada o manejo se torna mais difícil, evoluindo para uma maior gravidade.
O virologista Fernando Spilki afirma que, se comparada com outras doenças, a letalidade da dengue é relativamente baixa. Ainda assim, ela precisa receber a devida atenção. Diante dos números que colocam o Rio Grande do Sul na primeira colocação entre os estados brasileiros, o especialista apresenta uma série de hipóteses para o cenário atual.
— O que podemos teorizar: que o número real de casos pode ser maior que o reportado oficialmente; que talvez nem todas as pessoas estão buscando auxílio da maneira mais adequada; que podem estar ocorrendo, em algum lugar ou outro, falhas no diagnóstico. Nós temos ferramentas boas, como os testes rápidos e os laboratoriais, mas que precisam ser usadas de maneira adequada para evitar erros — argumenta o virologista.
Para o médico, que também é pró-reitor de pesquisa, pós-graduação e extensão da Universidade Feevale, o cenário atual é preocupante. Tendo em vista os anos anteriores, o surto costuma permanecer até maio.
— Nada impede que, nas condições atuais, a gente tenha incrementos mais fortes no número total de casos. Isso, lamentavelmente, incidiria em um número aumentado de mortes. A gente pensa que, dois anos atrás, tivemos cem mortes durante o surto inteiro de dengue no Rio Grande do Sul. É assustador que a gente já tenha alcançado mais de 40 nessa época — conclui Spilki.
Questionado se a taxa de letalidade não justificaria a distribuição de vacinas ao Estado, o professor afirmou que o tema é um tanto complexo. Para começar, seria necessário ter a certeza de que o número de casos é real.
— Se a população está procurando diagnóstico quando precisa, se todas as localidades e os serviços de saúde estão fazendo o diagnóstico confirmatório, anotando da maneira como esperaríamos num surto como esse. Talvez, tenhamos uma perda. Difícil termos um grau absoluto de certeza sobre a letalidade — observa Fernando Spilki.
Ele acredita que, muito provavelmente, a distribuição do imunizante não proporcionaria os resultados desejados. Primeiramente, devido ao tempo de espera, entre uma dose e outra, para fazer efeito no organismo das pessoas vacinadas. Em segundo lugar, porque a população mais prejudicada não faria parte da campanha.
— As vacinas não estão autorizadas para aplicação justamente na faixa etária dos idosos, onde temos a maior parte dos óbitos. O foco de prevenção tem que continuar sendo no combate ao mosquito e na proteção individual dos indivíduos mais vulneráveis.