Modelos meteorológicos preveem o início do evento na primavera, com intensidade reduzida. Resfriamento do Oceano Pacífico está ocorrendo de maneira mais lenta e gradual
Previsto originalmente para começar no fim do inverno, o fenômeno climático La Niña, até o momento, está confirmado, mas há incertezas. Enquanto parte dos modelos meteorológicos indicam atraso para o início do evento, outros preveem redução na intensidade da atuação. Até mesmo a ausência do fenômeno não é totalmente descartada. Com isso, são esperadas mudanças nos efeitos sentidos no clima do Rio Grande do Sul e do Brasil.
Inicialmente, as previsões apontavam que o La Ninã se iniciaria no fim do inverno – estação que segue até o dia 22 de setembro. Agora, de acordo com a Climatempo, o cenário de atraso aponta para uma leve variabilidade, entrando no começo da primavera. Já segundo o 6º Distrito de Meteorologia do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a projeção que se tinha anteriormente já era da chegada principalmente durante a primavera, e isso não se modificou.
O que ambos indicam é que o resfriamento do Oceano Pacífico, que vinha ocorrendo de maneira mais rápida nos últimos meses, passou a ter uma evolução mais lenta e gradual. Dessa forma, a previsão do La Niña está mantida, mas a força de atuação não deve ser a mesma.
— A tendência é de fraca intensidade, com poucos impactos no Brasil. Com o La Niña, geralmente há redução de chuva no Sul e aumento no Norte, mas a gente não vê esse cenário tão potencializado na nova atualização. É bom de maneira geral, tendo em vista o que se passou com o El Niño no último ano — destaca Guilherme Borges, meteorologista da Climatempo.
Segundo relatórios da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (Noaa) dos Estados Unidos, agência que é referência para meteorologistas, a temperatura do Oceano Pacífico chegou a 0,4°C acima da média entre os meses de abril, maio e junho, o que caracteriza o período de neutralidade, na transição entre os fenômenos climáticos. Uma nota publicada recentemente aponta 70% de chance de La Niña entre os meses de agosto e outubro.
— Mas a formação do evento, seu atraso e intensidade, são apenas um ponto. É um dos mais importantes, mas há outras questões que influenciam no clima, como a temperatura do Oceano Atlântico no Norte, projeção climática, passado recente e tendência do que vinha acontecendo. São vários aspectos considerados na previsão — explica o meteorologista Marcelo Schneider, coordenador do 8º Distrito de Meteorologia do Inmet.
Atualmente, as condições climáticas para o Brasil são de águas mais frias ao Sul do continente, contrastando com temperaturas mais quente à leste, na região Sudeste. A situação favorece a formação de ciclones e ar frio represado, avançando mês a mês para o Norte.
— Ainda continuamos com o bloqueio atmosférico, que aos poucos começa a diminuir de intensidade. Por isso, teremos um vaivém de frentes, uma alternância que deve contribuir para que a chuva fique mais próxima do normal nos próximos meses, talvez ligeiramente acima no norte do RS. A temperatura também fica bem variável, com períodos de frio e de calor — pontua Schneider.
Com a perda de intensidade do resfriamento das águas do Pacífico, a professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Meteorologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Nathalie Tissot Boiaski cita, inclusive, a possibilidade de ausência de La Niña:
— A probabilidade (para o fenômeno) é mais alta no trimestre outubro-novembro-dezembro. Porém, os indicativos de condição de neutralidade precisam ser considerados. Temos que acompanhar a evolução da temperatura da superfície do mar no Oceano Pacífico central-leste entre agosto e setembro para verificarmos a possibilidade de ocorrência da La Niña nos últimos meses do ano.
Conforme a professora, diante do enfraquecimento do resfriamento das águas superficiais no Oceano Pacífico nos últimos dois meses e do aquecimento anômalo no Atlântico Sul, podemos esperar chuva acima do normal na maior parte do RS no trimestre agosto-setembro-outubro, especialmente nas regiões norte e leste do Estado.
Segundo Borges, o La Niña tem por característica causar atraso na chuva da primavera, e tempo mais seco para o sul do país. Com as condições de intensidade fraca, não se espera esse cenário.
— Devemos ter chuva regular nesse primeiro ano de atuação. A agricultura comemora muito o primeiro ano de transição. Pode até ser uma chuva um pouco abaixo da média, mas não de causar seca — detalha.
O profissional ainda frisa que, caso se confirme o ingresso do La Niña somente para o início da primavera, os efeitos serão sentidos no final da próxima estação ou começo do verão. Isso ocorre porque a atmosfera demora para entender e se ajustar à mudança. Pelo atraso, o tradicional favorecimento no ingresso de ondas de frio tardias também deve ser reduzido.
— Vai ser difícil termos massas de ar gelado muito potentes lá para novembro. Não devemos, de maneira geral, ter geadas por esse período, como se viu no La Niña de 2022 — conclui.