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Colunista

CALIDOSCÓPIO

A valorização do professor, um bem vencido pela ignorância

(*) Jorge Adolfo de Arruda

Nos anos cinquenta, até final dos anos setenta, os professores mantinham “status especial”. Eram respeitados e tratados com reverência, respeito e até mesmo, medo, às vezes.

Já nos anos oitenta surgiram os tais “direitos humanos”, quando deveria ser uma garantia para os cidadãos, porém passou a ser um instrumento usado e abusado por “humanos não direitos”. Mas o prejuízo maior, quem acabou sofrendo, foram os professores. Como um passe de mágica, aqueles que eram tidos como “uma luz nas trevas”, passaram a ter suas ações contestadas, sua autoridade foi diminuindo na medida em que os tais direitos humanos ganhando corpo.

Hoje, o professor precisa se cuidar ao extremo, principalmente, quando está envolvido com crianças e adolescentes mal criados, porque os processos são os mais diversos: bulling, constrangimento ilegal, abuso de autoridade e por aí vai, a criatividade dos “ I ”- responsáveis pais. É uma usina de criatividade quando querem culpar os outros, no caso, os professores, por algo que era sua exclusiva obrigação e falharam.

Lembro dos anos 60, uma escolinha rural no interior de Carazinho, quando o nome desta simpática cidade ainda era escrito com crase no primeiro a, a Escola Reunida Sâo Bento ( a mais linda e charmosa comunidade do interior do mundo)(*), a professora era a Sra. Natália Reni Bastos, mas se quiserem intitulá-la de Excelentíssima Senhora não estarão errados, porque era este o status que ela mantinha. Uma morena, com ares de General, mas de uma sapiência invejável. Quando os alunos – aqui leia-se nós – faziam uma arte, às vezes eram corrigidos pela professora que usava toda sua autoridade e sabedoria, às vezes era um castigo, às vezes era um puxão de orelhas e, mesmo que jamais tenha nos surrado, tirando uma reguada aqui outra ali, mas sem muita violência, ela deixava transparecer que a qualquer momento poderia “virar os arrelhos” (*) e ninguém se atrevia a querer experimentar tal ira imaginária.

A Professora Natália exercia o juízo de origem que, no direito se chama “juízo a quo”, muito antes da existência dos hoje consolidados juízos especiais ( a instituição das transações penais), a Professora Natalia já exercia este procedimento com muita sapiência, autoridade e propriedade, e, sempre dava certo – para ela – porque para o réu (no caso nós), era apenas o início de um suplício.

Ao tocar da sineta indicado que a jornada escolar terminara, iniciava o tormento psicológico, sempre tinha alguém para dizer “eu vou contar prá mãe” ou “tua mãe vai saber que tu ganhou castigo”, pronto, àqueles quilômetros que separavam a escola da casa se transformavam em muitas milhas. Aproveitávamos este tempo para um exercício de fé, rezávamos muito para que os “bocudos” não contassem para a mãe, mas invariavelmente estas orações não chegavam ao céu à tempo e também não conseguíamos sucesso nas negociações para evitar que a fatídica notícia chegasse “lá em casa”.

Quando enfim chegávamos em casa, era como cair em um tribunal sumário. Os tais direitos hoje consagrados na Constituição no artigo 5º que tratam dos princípios do contraditório e da ampla defesa eram desprezados. O Tribunal “Mãe” não queria nem saber de desculpas, preparava uma vara e aplicava a sentença: “isso é prá ti aprender a respeitar a professora e não incomodar na escola”. O réu, com o lombo esfolado, ainda ganhava outras formas de castigo com alguns afazeres domésticos extras, até que nosso caso, ia parar no Supremo Tribunal, que todos sabiam ser muito mais rigoroso, a instância “PAI”.

O Pai chegava do trabalho, e, cansado, recebia a notícia que o tal fulaninho tinha incomodado na escola e tinha ganhado castigo. Mais uma vez, era completamente desprezados os princípios – hoje consagrados pela CF/88, dos direitos individuais do cidadão – contraditório? Nem pensar, ampla defesa? Capaz, simples alusões sem nenhum sentido prático ou pelo menos discutível. Mais uma reprimenda, geralmente com um pedacinho de couro do “finado boi” e a ameaça que, em caso de reincidência, seria pior. “Onde já se viu desrespeitar a professora”, e amanhã eu vou lá falar com ela, “dizia o pai”.

No outro dia o pai não vai trabalhar. Vai junto na Escola. A gente se cuida até no pisar no chão. Mas ‘péra’ aí, talvez o pai vai reclamar, será? Muitos pensamentos vagueiam, o pai poderia reclamar que filho meu não é para ser mal tratado por uma simples professora, vai sabê. Ao final uma constatação que dá até arrepios.

Chega a Professora, a gente, então, aprende, na prática, como é que se dirige a alguém que está acendendo a luz do saber na vida das pessoas. O Pai se inclina (mas o quê é isto, meu pai, que é grande, sabe tudo, que pode tudo,) se inclinando na frente de uma pessoa! A minha maior autoridade que já conheci na vida. Ele, quando a vê, tira o seu chapéu da cabeça – antes só vi meu Pai tirando o chapéu quando ia rezar – mas agora, lá estava Ele se inclinando, tirando o chapéu e beijando a mão da Professora.

Nossa, eu nunca mais vou desrespeitar esta Professora, ela realmente é algo transcendental, algo muito superior, acho até que é a maior das mortais. Meu pai então conversa com a Professora – sempre com o maior respeito e reverência – e lhe dá uma autorização expressa: a Senhora pode surrar ele, caso ele volte a se comportar mal. Pronto, agora sim, se estava complicada a situação, poderia piorar ainda mais. O remédio, então, era respeitar a professora ainda mais que respeitávamos o Pai e a Mãe.

E assim a gente aprendia como é que se tratava uma professora, com respeito, educação e total resignação. E, depois de algum tempo, a gente via que o Pai tinha razão, que a mãe tinha razão e que a professora tinha realmente sido a pessoa mais importante na nossa vida, afinal ela acendeu a luz do conhecimento, do saber e por isto, nossa vida se tornou melhor.

Que pena que o tempo passou! Que pena que estes valores foram perdidos! Que pena que hoje a classe dos professores, que continuam acendendo a luz do conhecimento do saber e do sucesso, que continuam dando a oportunidade para quem quer que seja, que se submeta a querer saber, a melhorar suas vidas, acabou se tornando apenas uma classe de empregados, que recebem nem um décimo do que mereciam, por cima, deixaram de ser dignas depositárias do respeito que sempre mereceram e que, ainda hoje, continuam merecendo.

Leis, direitos, conhecimentos, que foram se agregando, nada seriam se não existissem os professores. Todo conhecimento acabou andando em caminho inverso e acabou invertendo valores, que pena! Feliz é a Nação Japonesa, que é considerada uma das mais sábias do mundo, e que ainda mantém a reverência ao professor, por ser o mestre do saber. A obediência integra os valores daquele povo.

Será que um dia o Brasil vai resgatar estes valores perdidos ao longo do tempo? Será que um dia os cidadãos brasileiros irão valorizar os seus professores, ou seremos este povo incapaz de pensar por si próprio; um povo preguiçoso que gosta de ganhar tudo pronto, que não se esforça em encontrar o verdadeiro sentido das coisas e que aceita medidas que são impostas, ideias que lhe são entregues, como um prato feito, e que nem se digna a observar com cuidado, antes de comer, por isto, acaba ingerindo coisas inúteis, por vezes imundas. Que se aprenda e apenas, busque o conhecimento genuíno, com base na verdade, e que retome os valores perdidos no tempo quando se sabia dar o devido valor a quem realmente merece.

 

(*) Jorge Adolfo de Arruda é Jornalista(MTb 14.500) e Advogado (OAB/RS 110.415), natural de São Bento, município de Carazinho/RS. Filho de Orlando Gomes de Arruda e Filomena Adolfo de Arruda, irmão do Silvestre, Almerinda, Leda, Eva, Teresa, Adão, Cecília e Orlando. Casado com Mara Cristina de Arruda e pai de Dante Marcelo de Arruda, Thaise Vanessa de Arruda e Kalebi Adolfo de Arruda,a vô de Luany, Maria Raphaela, Marcela e Martin.

O texto ficou um pouco extenso, mas foi escrito com os dedos que apenas transcreveram palavras vindas do fundo do coração. É uma mistura de história com irresignação e uma homenagem a minha sobrinha querida que exerce a doce, singela e sagrada profissão de Professora ANDREIA DE ARRUDA MACHADO. Tenho muito orgulho de ti querida, que Deus te abençoe ricamente sempre!

(*) virar os arrelhos – Termo agauchado de alguém que, de um instante para o outro, fica muito bravo.


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