Causa das mortes de mãe e três filhas deve ser conhecida em 30 dias
A intoxicação por monóxido carbono é, até o momento, a principal suspeita da Polícia Civil como causa da morte de mãe e três filhas em Vacaria no último domingo (10). A tragédia levanta alertas de especialistas sobre o uso de geradores em ambientes fechados, além de sinais para identificar os primeiros sintomas de intoxicação por gás e a forma como isso ocorre no organismo.
No caso de Vacaria, morreram Cíntia de Moraes Costa, 36, e as filhas dela Samara Costa, três anos, Cintia Maria Costa, 11, e Ana Júlia Costa, 15. O companheiro de Cíntia, Maique Santos da Silva, 31, e outros dois filhos da mulher, Vitória Costa, sete anos, e Elias Costa, nove anos, sobreviveram. Eles permanecem hospitalizados em estado grave.
De acordo com o coordenador do Instituto-Geral de Perícias (IGP) de Caxias, Airton Carlos Kraemer, as vítimas foram submetidas a um exame que mede a quantidade de hemoglobina no sangue. A hemoglobina é uma proteína responsável pelo transporte de oxigênio dos pulmões para os tecidos por meio dos glóbulos vermelhos.
— Quando a pessoa respira o monóxido de carbono, esse monóxido se gruda na hemoglobina do sangue, formando uma molécula que a gente chama de carboxihemoglobina. A partir da formação dessas moléculas, o sangue perde a capacidade de trocar o oxigênio pelo carbono no pulmão e acaba levando a vítima à morte por asfixia. Então, com o exame, coletamos o sangue para verificar a presença dessa molécula no sangue e indicar a causa da morte — explica Kraemer.
Conforme o coordenador, todos os materiais coletados para exame foram encaminhados ao laboratório de perícias forenses do IGP, em Porto Alegre. No local, testes serão feitos para saber se havia, de fato, a presença de carboxihemoglobina nos corpos. Kraemer diz que os resultados devem ser conhecidos em 30 dias.
Segundo o capitão Gustavo Kist, do Quadro de Oficiais de Estado-Maior dos Bombeiros, a ocorrência atendida pela guarnição em Vacaria foi de alto grau de complexidade. Casos que envolvem monóxido de carbono têm dificuldades de confirmação rápida, principalmente, por se tratar de um gás que não possui cheiro.
— Fomos acionados pela Brigada Militar, que já havia inicialmente levado as crianças para o hospital e no local encontramos o homem (Maique), que já estava do lado de fora da casa e fizemos o transporte dele. Inicialmente acreditamos ser intoxicação por monóxido de carbono. Esse gás não tem odor e não gera nenhuma visibilidade, ou seja, não podemos ver ou sentir — menciona o capitão.
De acordo com a médica pneumologista do Hospital São Lucas da PUCRS e Hospital Mãe de Deus, Liana Ferreira Corrêa, a intoxicação com o gás carbono depende de alguns fatores e não apenas da exposição ao composto químico.
— A intoxicação, às vezes, não ocorre só pelo tempo em que a pessoa ficou exposta, mas também pela quantidade de gás. O ambiente pequeno também contribui por causa da quantidade de gás a que a pessoa foi exposta. Além disso, temos grupos de risco. Crianças e bebês são do grupo de risco para intoxicação por monóxido de carbono pela imaturidade do sistema nervoso central. Então, este público está mais suscetível à intoxicação, mas essa intoxicação também depende se a pessoa tem algum tipo de doença e quanto ela está próxima da fonte de emissão do gás — explica a pneumologista.
A médica explica que, apesar do gás não emitir cor ou cheiro, é possível analisar os primeiros sintomas de que a intoxicação está ocorrendo no organismo. São eles:
Quando a Polícia Civil e o Corpo de Bombeiros de Vacaria chegaram na casa da família, encontraram o gerador ligado e mencionaram um forte cheiro no ambiente. De acordo com Ivan Jorge Gabe, engenheiro eletricista e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) de Farroupilha, o cheiro sentido pela guarnição pode ter sido da queima da gasolina do gerador.
— O aparelho é um motor de combustão, movido a gasolina ou óleo diesel, que toca o gerador elétrico. Para funcionar, ele faz a queima do combustível, que gera gases. É igual ao motor de um veículo, por exemplo. Falam de “cheiro de gás”, mas como o gerador não era movimentado a gás e, sim, gasolina, o que tem cheiro é a queima que faz o gerador funcionar. A partir disso, em um ambiente fechado, o monóxido de carbono gerado pode assumir concentrações letais se for inalado pelas pessoas — explica o professor.
Ainda de acordo com Gabe, no caso de geradores, geralmente utilizados durante o inverno na região serrana do Estado, a orientação primordial é manter a circulação do ar no ambiente.
— Precisa haver circulação de ar. Muitos desses aparelhos ficam em ambientes fechados, mas é necessário evacuar os gases que eles emitem. Isso pode ser feito por alguma chaminé ou o mínimo de ventilação, porque isso evita que os gases acumulem no mesmo ambiente. Então, não precisamos dizer que esses geradores só devem ser usados dentro ou fora de casa, mas que eles precisam estar em lugares onde está havendo a evacuação dos gases e a circulação do ar — pontua Gabe.
Além do acúmulo dos gases no ambiente, quando não há circulação de ar, os geradores podem superaquecer e, em casos extremos, explodir.
— Quando o gerador não está funcionando, o combustível pode soltar algum gás ou evaporar algum gás e todos os tanques precisam ter um tipo de exaustão para retirar esses gases. A explosão é algo muito difícil de acontecer, mas é justamente por haver esse risco que é recomendado não deixar o gerador em ambientes fechados. A ventilação é fundamental para o uso de geradores, independente deles estarem ligados ou desligados — conclui o professor.
Colaborando com o espaço ventilado, a orientação do capitão dos bombeiros, Gustavo Kist, é para que todos os aparelhos como lareiras, aquecedores ou geradores sejam desligados antes dos moradores da mesma casa irem dormir. Isso porque, além da ventilação e da emissão do gás carbono, não é possível ter controle sobre possíveis curtos circuitos ou panes que os aparelhos eletrônicos podem causar quando ninguém está atento a eles.
Nesta segunda-feira (11), o hospital de Santa Maria, onde Vitória Costa da Silva, sete anos, e Elias Costa da Silva, nove, estão internados, informou que o estado de saúde dos dois é crítico. O Hospital Nossa Senhora da Oliveira (HNSO) de Vacaria não passou informações sobre Maique Santos da Silva. A última atualização sobre o homem foi dada no domingo e o estado dele era grave.
Na manhã desta segunda, ocorreu a cerimônia de despedida de Cíntia e das outras três filhas. Cíntia foi encontrada morta pelos socorristas na manhã de domingo e as três meninas morreram no hospital.
:: Por volta das 8h30min de domingo (10), Jonas Borges de Oliveira,32, chegou na casa da namorada, Ana Júlia Costa da Silva, na Rua Noel Rosa, no bairro Vitória, em Vacaria. A adolescente morava com a mãe, Cíntia de Moraes Costa, cinco irmãos e o padrasto, Maique Santos da Silva.
:: Ele estranhou a demora da família para abrir a porta e conseguiu entrar na casa pela janela, quando encontrou todos desacordados. Jonas chamou os socorristas e a Brigada Militar (BM). Quando as equipes chegaram, Cíntia já estava morta.
:: Os filhos e o companheiro dela foram encaminhados ao Hospital Nossa Senhora da Oliveira (HNSO), em Vacaria.
:: Samara Costa, Cintia Maria Costa e Ana Júlia Costa morreram domingo na instituição de saúde, conforme o delegado da Polícia Civil Anderson Silveira de Lima.
:: Vitória Costa e Elias Costa, além de Maique, que não é o pai das crianças, permaneciam hospitalizados até esta segunda-feira (11). Vitória e Elias foram transferidos ainda no domingo para um hospital de Santa Maria. O padrasto seguia em Vacaria.
:: Na casa, a polícia encontrou um gerador de eletricidade movido a gasolina. Esse equipamento, segundo informações preliminares, ficava sempre no lado de fora. Por esse motivo, a investigação aponta para uma possível intoxicação por monóxido de carbono gerado pela queima da gasolina.